sábado, 20/abril/2024
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BNDES em questão

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Economista por formação, tenho muitos amigos ligados ao BNDES: ex-professores, colegas de turma e ex-alunos, alguns já aposentados e outros recém-concursados. Todos têm, em escalas variadas, veneração pela sua casa profissional. Natural, pois é uma instituição que tem enormes e bons serviços prestados ao Brasil e ao povo brasileiro.

Mas, exatamente por sua importância para a economia nacional e por sua natureza pública, o desempenho do BNDES deve ser questionado e a eficácia de suas políticas precisa ser objeto de um debate democrático.

O BNDES define sua missão como "promover o desenvolvimento sustentável e competitivo da economia brasileira, com geração de emprego e redução das desigualdades sociais e regionais".

O IPEA nos informa que entre 2002 e 2016 o BNDES financiou cerca de US$ 14 bilhões para empresas brasileiras de engenharia atuarem em onze países da América Central, América do Sul e África. A favorita Odebrecht concentrou 80% desses financiamentos. O país mais contemplado foi Angola, com US$ 4 bilhões.

Primeiramente, é bom deixar claro que, em certas circunstâncias, pode ser de interesse nacional financiar empreendimentos no exterior. Eventualmente, isso pode fomentar empregos e desenvolvimento tecnológico internamente. Outras nações fazem isso, com desenvoltura, por meio de seus bancos de desenvolvimento. Assim, não se trata de um dogma. Mas é preciso demonstrar que tais operações observaram critérios mínimos de boa governança.

Nem é preciso entrar em detalhes quanto às confissões públicas da Odebrecht de que corrompeu ministros e presidentes em quase todos os países em que atuou; ou tampouco ser minimamente informado quanto ao fato de Angola ter um dos mais altos índices de corrupção do planeta. Algum chato poderia reclamar que o dinheiro do BNDES estaria financiando propinas a cleptocracias alienígenas em detrimento das tupiniquins. Não o faremos.

Há outros questionamentos. Para começar, não há projetos de infraestrutura que demandem investimentos aqui mesmo no Brasil? Por exemplo: a expansão da malha ferroviária para atender o escoamento da produção de grãos destinada à exportação ou a melhoria da infraestrutura rodoviária com a mesma finalidade, como a BR-163, cuja concessionária é controlada pela mesma Odebrecht. Se o BNDES tem por missão reduzir desigualdades regionais, se a produção de grãos do Centro-Oeste é vital para o saldo da balança comercial brasileira e se as deficiências logísticas são o maior entrave à competitividade internacional de nossa produção, como não esperar uma atuação mais incisiva do Banco em nossa região? Nesse mesmo período, de 2002 a 2016, quanto foi financiado para nossa infraestrutura?

Outro aspecto é o custo dos financiamentos. O Banco Japonês de Cooperação cobra juros baratos em seus financiamentos externos, mas suas operações se justificam financeiramente porque as taxas de juros internas no Japão são próximas de zero. No BNDES é o contrário. Para poder emprestar a juros muito inferiores à taxa SELIC, o BNDES recebeu maciços aportes de capital do Tesouro Nacional. Para isso, a União emitiu títulos da dívida pública, que remuneram seus compradores com uma das mais altas taxas de juros reais do mundo. Logo, essas operações são lastreadas com a expansão da dívida pública e o agravamento da situação fiscal do país. O custo da rolagem da dívida pública federal inibe investimentos diretos da União em educação, saneamento etc. Em outras palavras, o cidadão brasileiro está subsidiando o metrô de Caracas, o porto de Cuba e o aeroporto de Angola, entre outros, ao custo de menores investimentos internos.

Mais questionamentos devem ser feitos para a política de privilegiar grandes grupos como a JBS, que usou aportes da BNDESPAR para adquirir concorrentes, inclusive encerrando atividades e desempregando trabalhadores. Em vez de reduzir desigualdades, fomentou a concentração de mercado!

Há muito ainda que ser explicado e debatido.

Luiz Henrique Lima – auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT – graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.

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